8 de julho de 2011

cansaço



"Tudo o que eu pensei saber ainda é mistério
qual é a relação de Crato lá com New Orleans?
a chave do amor é uma risada ou é um jeito sério?
é singular o fecho todo ou já são vários fins?
é sempre o mesmo Deus ou troca como um Ministério?
é sempre a mesma afirmação ou já são vários sins?
é cheia a taça da paixão ou é um rio estéril?
são sete demos musicais ou doze querubins?
se a vida continua ou não ainda é mistério
o ciclo começa por onde: noite ou manhã?
o barco do destino é uma prisão ou é um grande império?
quem é que descerá dos céus nos braços de Tupã?
é sempre o mesmo Deus ou troca como um Ministério?
depois que a gente já mentiu a coisa ainda é sã?
a sorte é uma abstração, o azar é um mistério
e Deus frequenta a arquibancada do Maracanã..."
Oswaldo Montenegro - "Mistérios"

Por vezes me canso. É cansaço demais para mim, um balão de ar quente que, vazio, não pode levitar, nem soprar calor para aplacar o frio dos passageiros. Pessoas são balões, soprando umas dentro das outras, através de palavras e afeto, para manter o gás, os laços e o lastro. Até o silêncio - daqueles que preenchem os vãos e dão voz ao inconsciente - é gás. No entanto, canso-me de ver, estampados nos rostos dos meus balonistas, o tédio, os óculos escuros e os traços indeléveis do homo sapiens blasé, pós-moderno, que sabe de tudo um pouco e sente um pouco de nada. Para o balão, o placar é o seguinte: azar no jogo; azar no amor; azar nas escolhas. Acaso ou descaso? E já dizia o poeta: "a sorte é uma abstração; o azar é um mistério."

Aviso aos navegantes: balões murcham ou estouram quando não reabastecidos; trens não passam de cargueiros, circulando pelas mesmas estações e conduzindo passageiros ociosos demais para enxergar a paisagem; caravelas são valentes embarcações, mas geralmente naufragam sem um tripulante sequer para, da proa, atirar uma boia ao capitão. Resumo da ópera: no jogo, no amor e nas escolhas, seja um passageiro, e nunca o condutor. Estar de passagem é mais conveniente, mais econômico, menos doloroso e mais fácil de se desapegar: basta não entrar no balão, num vagão ou na barca. Ou, ainda, desembarcar à francesa, na estação mais oportuna entre o encontro e a perda. Arriscando-se menos, há menores chances de sucesso, é verdade, mas, igualmente, menores chances de fracasso. Ao condutor, restam o gás, o motor, o leme, as viagens e a entrega: tudo é mais cansativo e arriscado, e o apego ao transporte, ou melhor, ao passageiro, é inquebrantável. E já dizia o sábio do transporte público: "na vida, tudo é passageiro. Menos o motorista". E então, cara-pálida? Vais ou ficas?   

2 comentários:

  1. Alberto Lacerda16.7.11

    Eu Não Existo Sem Você

    Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
    Que nada nesse mundo levará você de mim
    Eu sei e você sabe que a distância não existe
    Que todo grande amor só é bem grande se for triste
    Por isso, meu amor, não tenha medo de sofrer
    Que todos os caminhos me encaminham pra você

    Assim como o oceano só é belo com o luar
    Assim como a canção só tem razão se cantar
    Assim como uma nuvem só acontece se chover
    Assim como o poeta só é grande se sofrer
    Assim como viver sem ter amor não é viver
    Não há você sem mim
    Eu não existo sem você

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  2. Adoro essa canção, Alberto! Vinicius e Tom, sempre. Estava sentindo sua falta por aqui, quero dizer, dos seus comentários, porque sei que você lê todos os posts. Abraço grande, meu amigo.

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