8 de abril de 2011

o seqüestro (parte 1)

O pai guiava o carro na estrada sinuosa lentamente. A mãe, no banco do carona, olhava distraída a paisagem pela janela. Uma bossa tocava baixinho no rádio, enquanto pai e mãe deixavam-se boiar na maré dos próprios pensamentos, submersos num silêncio de torpor. O inverno ainda não havia começado, mas o vento já soprava frio nas copas das amendoeiras e jaqueiras nas alamedas. No banco de trás, olhos trigueiros e redondos feito bolebas pretas, o menino espichava pescoço e canelas, sua atenção voltada para as lojinhas coloridas de artesanato que margeavam a rodovia. Vezenquando ele colava o rosto na janela para ver as crianças que caminhavam em fila pelo acostamento. Os menores iam de mãos dadas com os mais velhos e levavam sacos plásticos com biscoitos e pipoca-doce. Um garoto ruivo, de pernas compridas, com calças curtas que mal lhe cobriam os tornozelos, liderava a molecada; nas mãos, uma bola de futebol, o couro puído desfiando nos contornos de tinta. Era o meio da manhã de um sábado, e o sol derramava uma luz amarelada sobre as colinas verdes de Petrópolis. O pai decidira vir na noite anterior, para evitar o trânsito pesado de final de semana na subida da serra. Chegaram à casa tarde, o carro coberto de sereno, mas não descarregaram as malas; o menino cabeceava de sono e a mãe, entediada da viagem e sôfrega por um cigarro, não faria questão de subir a escadaria com malas feitas à maneira militar pelo marido. Que ficassem para a manhã do dia seguinte.

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