17 de novembro de 2010

oitenta e três

A vida caminha, comigo em seu encalço, e levanta poeira. Sou poeira.
No arrastar do tempo, imprimo marcas em estradas por onde caminhei um dia, sabendo que hei de deixar rastros em trilhas que ainda visitarei.
Vida, trajetória e pó. Ela venta pelo meu corpo e pela memória, e leva consigo parte de mim, de sonhos insones que me acalentam. E assombram.

É tênue essa brisa, que traz saudades e faz renascer esperanças. Esperança para hoje, para amanhã, para ontem! Esperança de vida, de quietude e de menos ventania dentro de mim...
Sou pó e terra, sim, mas também um lençol d'agua, de um querer intenso, um manancial que deseja despertar desse sono dormente.
Rio fluido, prenhe de sonhos, sigo para o mar (que é para aonde seguem todos os rios...). O mar aberto da realidade da terra, do solo e do enraizar. E tento, assim, alocar em mim, pequeno e finito, sonhos contraditórios, de desejos opostos...
Na ambivalência intensa e solitária que sou, no avesso do meu poder (que é esse meu inquieto querer), os sonhos de uma vida pela qual passei (ou terá ela passado por mim...?), são consumidos, abafados e soterrados.
Não velejam, como deveriam velejar de vento em popa os sonhos, mas hibernam, no escuro das lembranças, na estagnação do pó, e no correr das horas.

Mas há orgulho inquieto em mim. Meu coração pulsa, o sangue jorra. Esperança! Plenitude! Amor! Eu clamo por eles, na ambiguidade que revelo ao mundo.
E, no sussurro da noite, sob estrelas que admiro e que também habitam essa alma, eu rogo, numa prece silente, em que escuto apenas o pulsar de meu coração, jovem, vivaz e tortuoso: 
Que jorre vida em minhas veias e em meu espírito. Jorrem forças para a vida caminhar, e obstáculos ultrapassar.
E que, da raiz que sou, até as folhas por onde abro meus olhos para o horizonte, brote-me coragem para viver essa vida comprida, e sentir alegria, quase sempre sofrida, mas destemida.

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