9 de fevereiro de 2011


“…me diz o que é sufoco que eu te mostro alguém a fim de te acompanhar…”
Há um medo de amar pairando no ar. E quase metade da população respira esse medo.
Quando dobramos os joelhos e chegamos ao chão, ficamos lá por um tempo, porque queda dói. E lembrar como se levanta custa um pouco, por mais que já tenhamos caído algumas vezes.
E aí lá vai você se erguendo, ainda com os joelhos ralados, mas doendo menos que antes. E você consegue curvar-se e já não olha mais pro chão, olha em volta. Esse é um momento importante, decisivo.
Quando você olha em volta, querendo voltar a correr, você vê corredores fortes, sempre sorridentes, com a auto-estima em dia, muito em dia, eles (parece que) nunca se machucaram, olha que ilesos e felizes que eles são. Isso dá medo, aquele medo que se propaga na atmosfera. Porque pessoas assim não sentem, não pensam antes de abrir seus caminhos a golpes de facão, vão passando e deixando rastros e não olham pra trás. Que firme, que robótico, que desalmado.
Então você pensa: eu sou o único aqui com cicatrizes no joelho? Eu não quero me envolver com essa gente de plástico. Mas então eu ficarei sozinho? Ó Deus, ó vida, ó pai ó.
Não se sabe ainda se é solução, mas um dos corredores, um dia, pensou: e se eu correr mais lentamente e esperar o pelotão daqueles que têm cicatrizes como eu? Pode ser uma saída, pode ser uma entrada.
Porque gente que traz marcas no joelho, nas costas, no ombro, na cabeça, se reconhece. Porque quem sabe o que é dor, não espalha mágoa. Porque quem já chorou, não semeia lágrima. Porque quem já dormiu com o travesseiro em cima da cabeça, não planta pensamentos de chumbo. E quem já dobrou o joelho, não dá pernada. Quem já ficou insone, não liga o alarme do outro. E quem já viveu sufoco, sabe ler no olho do outro uma lembrança de falta de ar.
Bem, era pra ser assim.
Mas o pessoal robótico está à solta.
Se eles têm marcas? Ô se tem, mas estão muito bem escondidas debaixo de suas roupas aparentemente desenhadas para não deixá-los sequer suar.
Eles sabem o que é sufoco, mas eles não estão a fim de acompanhar você. Eles colocam você numa nuvem de poeira. Eles correm na sua frente.
Você com essa cicatriz aí, meu caro corredor, não preste atenção apenas na marcha, fique esperto: pergunte o que é sufoco.

5 comentários:

  1. "E se o caso for de ir à praia eu levo essa casa...
    numa sacola..."

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  2. querendo, a gente leva o que for na sacola, não é mesmo? =)

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  3. Sim. na minha sacola já tem guarda sol, espreguiçadeira, isopor, mate, frescobol... e medo de amar.
    Bora pra praia?

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  4. Miss P. mexendo com a cabeça de meus antigos e cativos passageiros...

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  5. ixe, se me chamar pra cachoeira, ok.
    levo até uma cesta de piquenique onde o medo de amar tem pavor de entrar.

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