4 de fevereiro de 2011

(Na TEMPESTADE) O encontro do poeta torto de chorar com o poeta torto de andar.

Tenho aquela tatuagem, Roberta: o sol e a lua, um grudado no outro, um com os olhos do outro. Câncer e Leão. Cansa amar a tempestade, cansa rezar pra ela não aparecer. Com certeza a poesia se cansa igualmente dessa mania desnecessária de ter que escolher um movimento ou outro sobre ela. Mas, não sei, ela é esquisita, como eu e você e os tortos mil. Como tudo que torto é, fica eu, fica você, fica a legião de anjos tortos de um lado a outro, de um movimento a outro. É que a gente escolhe vez um só, vez outra só outro mesmo. E se fizéssemos os dois ao mesmo tempo? Fica parado pra umas coisas, anda pra outras...
Eu queria correr menos, mas..."meu sangue latiiiinooo". Mas você corre também, caranguejo, igual a leoazinha de juba vermelha. "Minha alma catiivaaa"...
Quando eu era uma mera ascendente à adulta, meus desenhos eram sempre expostos nas paredes da escola: todos abstratos. Não sei nada de linha reta. Nem sei contar história, elas são linhas. Mas... fala "VERSO" pra você ver. A gente já fica torta, na boca, no céu da boca, a gente já fica torta só de falar VERSO.

(Na TEMPESTADE) O encontro do poeta torto de chorar com o poeta torto de andar.

As águas nervosas lá de cima
Já se embriagavam dos pés dos poetas
Quando um pé vindo da direita
Foi-se contra um pé vindo da esquerda:
Pingos riram-se de um lado pro outro.
Só o céu e a terra sabem a graça
Que fazem com os poetas de lá e cá.
O poeta, aquele torto de chorar,
Correu-se daquele lado em lamentar.
Que de jeito outro iria tal poeta
Colocar-se a movimentar senão
Num disparo torto da fuga alcançar?
O poeta, aquele torto de andar,
Correu-se do lado outro a cantar.
Que todo jeito é jeito pra tal poeta
Colocar-se a girar e fazer
Um riso torto de tropeçar.
Diz-se das pessoas todas, pelos cantos todos,
Que uns são de linha reta,
Outros são de andar já torto,
Diz-se desses que os cantos
São de poesia e que nela uns usam
Capa de proteção, outros adoram se ensopar.
Parece que cansam-se os dois.
Os dois poetas se cansam de ser tortos.
Na tempestade. De vez em vez: cansam-se.
Mas a tempestade só se ri:
Não há o poeta, nem um nem o outro,
Há só a água que dela cai e que dela
Foge um, pra ela corre outro.
O torto que chora não sai do lugar
Esperando ela passar,
Quando sai se molha demais e fica doente.
O torto que anda só fica de um lado pro outro
A lhe procurar,
Quando sossega não entende o que é permanecer.
A terra ressente-se dos seres tortos,
Reclama com a tempestade a lentidão
Que aos dois se faz idêntica:
Velocidade de um só pra esconder,
Velocidade do outro só pra exagerar.
No que o poeta torto de chorar
Corre pra das estações o mudar escapar,
O poeta torto de andar
Corre pra das estações a permanência não se mostrar.
Ressente-se a terra dos seres tortos,
Colocados na margem,
Quando o seu cheiro molhado predizendo a água
Convida-os a dela se afastarem,
Por razão uma ou outra,
Não fecundam eles a contradição
Linda e torta – céu e terra:
Poesia com vida.

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